os dias do minotauro

"porque pertenço à raça daqueles que mergulham de olhos abertos

e reconhecem o abismo pedra a pedra anémona a anémona flor a flor"

 

Sophia de Mello Breyner Andresen

m

 










 

 

 

 

quinta-feira, maio 10, 2007


 

 

 

Dia recorrente

 

 

Ter dentro um bicho que salta. Um bicho vivo que come, que morde, que rói, que gasta. O lugar fechado de um peito, caverna escura, recôndita, lugar insuficiente para um bicho de membros enrolados, entorpecidos, raivosos. O bicho morde e come e engorda e inquieta-se - quer crescer. Quer crescer e não pode. O bicho acorda em momento incerto, rasga a pele num lugar de fragilidade - de ferida - onde o tecido se deslaça, semi-translúcido, como o linho roto, poído, de uma saia muito usada. Salta e abocanha, com dentes gigantescos, cada naco de gente, de mundo, ao alcance dos seus braços esfomeados. Ter dentro um bicho que salta, rebelde, e destrói. Depois recolhe triste, mudo, encolhido, à escura caverna onde habita. Prega-se às paredes do peito como um molusco. Finge-se de morto. Não se dá por ele durante muitas noites a fio. Ouve-se apenas, quando o silêncio é denso, uma respiração pesada como o som de pedras a rolar montanha abaixo.

 


posted by saturnine | 22:16 | 3 comments

 

 

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Pablo Picasso

Minotauro

 

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Lhasa

Soon this place will be too small

 

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